domingo, 14 de agosto de 2011

A morte misteriosa do Planejamento

     Quando Planejamento, sua esposa Urgência e sua filha Pressa se mudaram para o Residencial Marketshare, parecia que seriam “felizes para sempre”. A nova família foi muito bem recebida por condôminos e funcionários.

     Entretanto, o tempo tratou de ir trazendo a dura realidade do Marketshare para o Planejamento.

     Dona Rotina, a síndica, logo caiu nas graças de Dona Urgência. Tornaram-se inseparáveis companheiras e confidentes. Passavam o dia inteiro batendo perna pelo condomínio. Quase nada lhes escapava aos olhos e à língua. O que não viam, inventavam. Sem saber exatamente por que, Planejamento não gostava daquela amizade da Rotina (uma falsa) com a Urgência.

     O morador do apartamento 171 também incomodava. O senhor Walmir Mercado era figura imprevisível. Sofria de transtorno bipolar severo, alternando dias de simpatia, serenidade com momentos de extrema irritação e instabilidade. Por conta disso, vários foram os desentendimentos do Mercado com Planejamento – principalmente quando aquele entrava em delírios, alucinações e manias de perseguição, bradando ameaças escatológicas e apocalípticas pelos corredores.

     Morava na cobertura, o Senhor Resultado. Cara esquisito. Dizia-se comerciante, mas era mesmo um agiota. Envolvia as pessoas com conversa mole, convencendo-os a associarem-se a ele em algum novo negócio. Levava seus sócios a empenharem suas parcas economias na nova empresa. Quando o dinheiro acabava (e isso sempre acontecia), emprestava-lhes a taxas de juros pra lá de abusivas. Logo, o incauto empreendedor estava irremediavelmente preso e dependente do Senhor Resultado. Planejamento também acabou vítima do conto do Resultado. Investiu tudo em um supostamente promissor e milionário negócio de enfeites de feltro para árvores de natal.

     Em pouco tempo, não teve outra saída se não hipotecar seus imóveis para pagar parte das dívidas. Planejamento estava falido e desacreditado.

     As desavenças com o morador do apartamento 171 também eram cada vez mais freqüentes. Certo dia, após um desentendimento sobre vaga no estacionamento, muitos ouviram o Mercado aos berros no hall de entrada: “O Senhor vai ver, seu Planejamento. Ainda acabo com a sua vida.”

     Como se não bastasse, a Rotina (que não era de confiança mesmo), não se sabe exatamente por que, passou a chantagear a Urgência por conta do segredo do nascimento da Pressa. Como Urgência não cedeu à pressão, a ex-amiga escreveu carta anônima e enviou para o Planejamento. Ao ler aquela história escabrosa, Planejamento passou a pressionar a sua esposa para que contasse a verdade. Ela negava veementemente, mas ele estava determinado a ir até o fim.

     Assim, constantemente assediado por truculentos cobradores do Resultado, ameaçado violentamente pelo Mercado, em pé de guerra com a Urgência, Planejamento passou a viver dias de insegurança e medo.

     Certo dia, o professor de dominó do condomínio, ao abrir sua academia, deparou-se com o corpo já sem vida do Planejamento, debruçado sobre a mesa principal.

     Estava estabelecido o mistério. A primeira versão dava conta de que o Planejamento tinha sido vítima de mal súbito. Sabedor de que havia muita gente interessada na sua morte, o delegado local insistiu em encomendar uma autópsia – contra a vontade da viúva. No procedimento, legistas descobriram altas doses de Coca-cola Diet e Mentos em todo o sistema digestório do finado.

     Não havia dúvidas: Planejamento foi assassinado. E a polícia já tinha uma legião de suspeitos.

     Afinal… quem você acha que acabou com o Planejamento? As armadilhas da Rotina, a instabilidade do Mercado, as pressões do Resultado, ou a imprevisível Urgência?

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